Turismo Colaborativo
A era da informação fez emergir não só novas formas de comunicação e mobilidade, mas também novas formas de consumo. Nesse sentido se encontra o Turismo Colaborativo que, por sua vez, é comumente atrelado a Economia Colaborativa. Este último trata-se de um sistema descentralizado que permite conectar indivíduos e grupos para colaborações diversas por meio de plataformas online (Botsman e Rogers, 2011 apud MATOS, 2016). Martins (2017) acredita que esse tipo de consumo se trata, basicamente, de um resgate de práticas do passado tradicionais nas primeiras manifestações de comércio, e que acabaram adquirindo desuso.
Nesse sentido, o Turismo Colaborativo se caracteriza como um movimento de trocas (não necessariamente monetárias) de produtos, serviços, informações relacionadas a atividade turística, que podem ou não envolver uma troca monetária, e são facilitados por plataformas digitais colaborativas. Ainda, a novidade que aparece junto ao ressurgimento desta forma de realizar atividade econômica, são as plataformas digitais e os aplicativos que se apresentam como um meio facilitador para tal. Tais plataformas (principais ferramentas que difundem o Turismo Colaborativo) que são, em sua maioria, descritas por blogs de viagem ou notícias sobre essa tendência, são listadas em diversos tipos: sites de troca de habilidades por hospedagem, a exemplo do Worldpackers; ou aplicativos de compartilhamento de transporte, como BlaBlaCar; ou ainda, sites de experiências oferecidas por residentes, como o Rent a Local Friend; ainda, podem ser encontrados sites de guias e/ou recomendações, a exemplo do TripAdvisor (Janelas Abertas, 2018).
Através do levantamento bibliográfico, que considerou a dimensão de abrangência do Brasil, observou-se que este tema se apresenta como uma recente discussão, e que em sua maioria é analisado apenas pela perspectiva da Economia Colaborativa. Assim, esta pesquisa objetiva compreender a tendência do Turismo Colaborativo nas relações sociais e as plataformas digitais que surgem a partir dessa lógica. Além disso, a pesquisa se dá por meio de revisão bibliográfica, levantamento de plataformas digitais, além de análise crítica pelo viés sociológico.
Nos resultados preliminares foram encontrados apenas 6 (seis) artigos que discutem as viagens colaborativas em geral, ou analisam o assunto por meio de uma plataforma específica. Ainda, foram levantados 7 (sete) materiais classificados como “outros”, por considerar trabalhos de conclusão de curso, boletins, e anais de evento.
Com relação às áreas dos autores que publicaram sobre, tem-se majoritariamente pesquisadores do Turismo e da Administração, sendo esta última a área de maior predominância até o momento.
Quanto aos materiais não acadêmicos, percebeu-se maior quantidade de materiais que estão discutindo sobre o assunto, sendo os principais meios, os blogs, os quais somam-se 13 (treze). Estes têm apresentado dicas sobre esta tendência, resenhas de algumas plataformas digitais específicas e/ou o tema do Turismo Colaborativo em geral. Ainda, quanto a matérias de jornal, coletou-se 9, que são voltadas a explicar o que é essa nova modalidade, ou apresentam o assunto como um tipo de voluntariado, e ainda alertam quanto aos riscos de uma possível exploração da mão de obra de viajantes.
Foram levantadas, até o momento, 30 plataformas digitais que se utilizam da lógica do consumo colaborativo na atividade turística. Entre elas estão algumas conhecidas no mercado, como Couchsurfing, Airbnb, WWO, e a recente adicionada Buser. Todas elas, de alguma forma, utilizam da colaboração de usuários de diversos lugares do mundo, que realizam trocas de serviços, experiências, informações que dizem respeito ao turismo. Aparecem também, plataformas voltadas a alimentação, ou até mesmo de transporte marítimo.
Principais conceitos relacionados ao assunto
Consumo colaborativo
De acordo com Krishnan et al (2003) apud Fornari e Bauer (2017), o consumo colaborativo é considerado como um sistema peer-to-peer que se baseia em compartilhar bens e serviços por meio da tecnologia de plataformas digitais. Matos et al. (2018) ressalta sobre o assunto que alguns aspectos relacionados ao conceito do consumo colaborativo encontrados na literatura, não demonstram a obrigatoriedade de conexões entre os indivíduos envolvidos para além da participação online.
Consumo colaborativo e relacional
Este conceito tenta ir além do consumo colaborativo, a fim de expressar a necessidade da relação neste tipo de atividade. Matos (2018) afirma que o consumo colaborativo é sobretudo relacional, onde é possível haver trocas que, não necessariamente são monetárias, e é necessário existir interação de dois ou mais indivíduos. Estas trocas de bens tangíveis ou intangíveis, são permitidas através de plataformas caracterizadas como redes. Neste caso, o consumo é apresentado como uma forma de sociabilidade que é regida pelo capital reputacional, onde é permitido ligar a vida comum e o consumo, sem obrigatoriedade de ter a moeda como elemento central, mas sim, as relações sociais.
Sociabilidade em rede
Baseada em Wittel (2001), Matos identifica que o conceito de Network Sociality (Sociabilidade em Rede) consiste em relações intensas e temporárias, onde não há troca de narrativas, mas de informações que assimilam-se entre trabalho e lazer, e são cercadas pela tecnologia facilitadora da mobilidade e co-presença.
Hospitalidade em rede
Contextualizando com a ideia da hospitalidade virtual, Matos (2016) explica que o fenômeno social onde a relação hóspede x anfitrião é ligada pelo uso de tecnologias e plataformas da web é o que caracteriza a discussão sobre hospitalidade em rede. Nisso, parte-se do pressuposto de que já se vive em uma sociedade tecnológica no cotidiano, e que tais usos são apropriados para diferentes interesses e significados. O conceito de Network Hospitality de Molz (2014) apud Matos (2016), ressalta ainda algumas características comuns nas discussões, como a gestão da reputação como elemento de importância nessas relações, uma vez que há diferentes moedas de troca em questão. Além disso, as relações geradas pelos encontros temporários geram intimidades temporárias, podendo haver também integração entre trabalho e lazer nessa reconfiguração do social cotidiano.
Economia colaborativa
De acordo com Jesus (2018), a economia colaborativa está baseada no acesso aos recursos, sem necessariamente adquirir a propriedade deles, sendo isto mediado por plataformas de comunicação, onde são estabelecidas relações de confiança entre os indivíduos envolvidos na negociação. Assim, com base em Fornari (2017) entende-se que no lugar de se fazer a compra de um produto ou serviço, realiza-se uma troca ou seu uso compartilhado. Para ela, essa economia é baseada no modelo instituído pela geração Millenials (nascidos entre meados de 1970 e 1990), onde é possível ver o surgimento de uma espécie de novo escambo, que determina a criação de novas ideias de colaboração e compartilhamento de bens e serviços em um espírito coletivo, visando um estilo sustentável e menos consumista. Acredita-se que os primeiros sinais da Economia Colaborativa no Brasil foram observados no surgimento de sites de compra coletiva, como por exemplo o Peixe Urbano (2010), e no contexto do turismo, o Hotel Urbano (2011).
Viagem colaborativa
Giménez (2014) apud Fornari (2017) estabelece a viagem colaborativa ou o turismo “P2P” como o emprego do conceito de consumo colaborativo na atividade turística. Consiste na forma tradicional de compartilhamento, troca, intercâmbio entre comunidades por meio de mecanismos tecnológicos. Ainda, baseada em Benckendorff, Moscardo, Pendergast (2010), ela descreve que a geração Millennials introduziu um novo modelo de viajar, onde gasta-se menos, realiza-se troca de conhecimento e impressão do local visitado, além do foco na experiência.
Plataformas peer-to-peer
As plataformas online peer-to-peer são definidas por Jesus (2018), basicamente, como aquelas que mediam o desenvolvimento da economia colaborativa. Esta última, que está baseada no acesso e consumo de experiências focadas em aspectos intangíveis, foi facilitada pela “[...] criação de plataformas virtuais que permitiram aos usuários compartilhar bens subutilizados, mas que poderiam ser usados para transações econômicas” (Jesus, 2018, p.5). Molz (2014) apud Matos (2016) exemplifica que os sites peer-to-peer são utilizados pelos indivíduos para compartilhar bicicletas, vagas em estacionamento, ou outros bens comuns no dia a dia para estranhos ao redor do mundo.
Compartilhamento ou Sharing
Baseada em Belk (2007, 2010), Matos (2016) descreve que o compartilhamento é visto como o ato de transferência do que é de um indivíduo para outro, e vice-versa, sendo passível desse compartilhamento bens tangíveis ou intangíveis. Bezerra e Feirreira (2018) também usando Belk (2017), demonstra que nesse sentido, compartilhar evidencia-se como uma questão funcional ou de sobrevivência, onde o ato é feito voluntariamente para distribuição do que é seu a outros.
Plataformas
Plataforma | Objetivo |
WorldPackers | Troca de habilidades por acomodações. |
Rent a Local Friend | Possibilidade de contratar alguém local que está cadastrado na plataforma com os mesmos interesses e língua. |
CouchSurfing | Faz a ponte entre turistas que querem hospedagem grátis durante uma viagem e pessoas que gostariam de receber esses visitantes |
Airbnb | Serviço que permite que pessoas do mundo inteiro ofereçam suas casas para usuários que buscam acomodações mais em conta (normalmente, se comparado com alguns hoteis) em qualquer lugar do mundo |
BlaBlaCar | conecta condutores com lugares livres no carro a passageiros que vão para o mesmo destino. Eles viajam juntos e dividem os custos de gasolina e pedágio, por exemplo. |
SocialBoats | permite que o turista identifique embarcações disponíveis para aluguel. O objetivo é tornar a navegação mais viável e acessível. |
Izi.Travel | criado para que pessoas que conhecem determinado local possam compartilhar seus conhecimentos e experiências para milhões de outras pessoas que estejam interessadas nesse mesmo local. |
Nightswapping | possibilidade de se hospedar em uma residência, ou em só um cômodo dela, e também de oferecer hospedagem para viajantes. A cada troca feita, o colaborador acumula moedas em uma carteira virtual que o ajudaram a ter um saldo suficiente para realizar novas trocas. |
House Sitting | serviço onde proprietários de residências oferecem hospedagem a pessoas interessadas em ajudar com algum tipo de serviço, enquanto viajam para outro destino. |
TripAdvisor | é voltado para alimentação de informações sobre turismo e viagens, a partir das experiências dos próprios viajantes. É sustentado pela publicidade das operadoras de serviços turísticos. |
Warm Shower | específica para pessoas que querem oferecer hospedagem para cicloturistas |
EatWith | destinada a conectar anfitriões que gostam de cozinhar a pessoas interessadas em comer e fazer novas amizades |
Workaway.info | semelhante ao house sitting, a plataforma conecta viajantes e anfitriões que precisam de algum tipo de trabalho voluntário em troca de hospedagem. |
Buser | Conecta pessoas que querem viajar para o mesmo destino com empresas de fretamento executivo intermunicipal, onde elas mesmas podem abrir grupos em que outros viajante se interessam para acompanhar. |
WWOF | Rede de organizações nacionais que promovem o trabalho voluntário em pequenas fazendas ecológicas em várias partes do mundo |
House Carrers | Estadia em troca pela proteção e cuidado de suas residências e pets durante o tempo em que estarão fora |
Home Exchange (antigo troca casa) | Permite troca de residência com outros viajantes. |
Dinner | Possível combinar jantares na casa de anfitriões locais a preços acessíveis. Brasil lidera em número de pessoas cadastradas. |
Vayable | plataforma que reúne vários residentes locais que disponibilizam tours pelo destino escolhido.Existem guias de gastronomia, arte, arquitetura, compras |
Misterb&b | Mesma lógica do Airbnb, porém voltada para o publico gay. |
Trocacasa.com | Nesse site, usuários de diferentes localidades que desejam viajar para algum destino, permutam, por um período determinado, de lar. Os usuários não se conhecem pessoalmente e, mesmo após a troca de casa, podem nunca estabelecer um contato presencial. |
Beliive | Plataforma baseada em banco de horas na qual os usuários oferecem algum serviço presencial que, quando prestados, tem como consequência a geração de créditos a serem utilizados na aquisição de outros serviços ofertados na plataforma. Amigo para ouvir desabafo, companhia para ir ao cinema, conhecer a cidade do Recife de bicicleta, dicas de uma mochileira, são exemplos, dentre outros, de ofertas disponíveis na plataforma. |
Partywithalocal.com | rede que sugere a possibilidade de um turista se conectar na plataforma e encontrar alguém de um determinado lugar com quem possa sair para uma festa. |
Meal sharing | plataforma que habilita o compartilhamento de comida ao redor do mundo e permite que usuários tenham a experiência de fazer uma refeição na casa e na companhia de um autóctone. |
HouseTrip | Plataforma destinada a aluguel de temporada ligada ao TripAdvisor Rentals, sendo assim, possível de se ter maior exposição (para os proprietários), e possibilidade de visualizar avaliações feitas por outros usuários. |
Wimdu | Site de aluguel de temporadas ou pernoite ao redor do mundo para provedores comerciais e privados, que pode ser vinculado aos vários sites de reserva dos provedores. |
9flats | Permite alugar apartamento, quarto ou casa de outras pessoas que estão em busca de uma renda extra. |
HomeAway | Plataforma de anúncio e aluguel de casas, apartamentos, estúdios, vivendas para temporadas. |
FlipKey | Voltada a aluguel de temporada e integrante do grupo TripAdvisor Rentals. |
Gigoing | Plataforma web que promove o intercâmbio entre locais ou estabelecimentos e usuários domésticos em todo o mundo. |
Referências
MATOS, B.G; BARBOSA, M.L.A.; MATOS, M.B.A. Consumo Colaborativo e Relacional No Contexto do Turismo: a proposição de um modelo entre a sociabilidade e a hospitalidade em rede. Revista Hospitalidade. São Paulo, volume 13, n.01, p. 218-241, agosto de 2016.
FORNARI e BAUER. Impressões de estudantes de turismo brasileiros sobre o House Sitting e a Era da Viagem Colaborativa. RT&D | n.o 27/28 | 2017 | (arrumar)
LUCIANA ALVES RODAS VERA - MARLUSA DE SEVILHA GOSLING. Economia Compartilhada no turismo: uma discussão teórica sobre o consumo colaborativo e o compartilhamento. Estratégia e Negócios. v. 10, n. 1 (2017)
DIEGO SANTOS VIEIRA DE JESUS. Fique como um gay local: o MisterB&B e a acomodação peer-to-peer no rio de janeiro. Turismo, estudos e práticas. v. 7, n. 2 (2018)
TURISMO, VIAGEM E ECONOMIA COMPARTILHADA: AS EXPERIÊNCIAS RELATADAS PELOS USUÁRIOS DO COUCHSURFING EM NATAL/RN