Sem motivos para comemorar
Hoje é o Dia Internacional da Enfermagem, mas os profissionais da área não parecem ter motivos para comemorar: por atuarem na linha de frente do combate à pandemia, muitos deles têm sido infectados em suas atividades. Para medir o impacto da Covid-19 sobre essa classe profissional, pesquisadores do Laboratório de Avaliação Econômica e de Tecnologias em Saúde (Laets) produziram um estudo a respeito dos chamados anos de vida perdidos ajustados pela incapacidade (Daly, na sigla em inglês) em função da doença, no Brasil.
Além dos cientistas do Laets, vinculados aos programas de pós-graduação em Enfermagem (PPGENF) e em Enfermagem e Biociências (PPGENFBIO), participaram da pesquisa profissionais do Hospital Federal Cardoso Fontes. O artigo foi publicado em formato preprint – ou seja, disponibilizado para acesso aberto, ainda sem revisão por pares – na plataforma SciELO.
O Daly é um indicador que mede simultaneamente o impacto da mortalidade e dos problemas de saúde que afetam a qualidade de vida dos indivíduos. Tanto os anos de vida perdidos por morte prematura quanto os anos vividos com incapacidades decorrentes de determinada doença são calculados, em relação à expectativa de vida na faixa etária analisada. “É um esforço sistemático da comunidade científica para tentar quantificar a magnitude da perda de saúde decorrente de doenças, lesões e fatores de risco por idade, sexo ou ocupação, por exemplo, levando em consideração períodos específicos”, destaca o autor principal do artigo e coordenador do Laets, Roberto Carlos Lyra da Silva.
O delineamento da pesquisa foi de um estudo ecológico, em que o grupo “profissionais de enfermagem” foi analisado. No Brasil, há registros de inúmeras vítimas fatais nessa classe profissional, e muitos afastamentos por conta da doença – o que compromete a força de trabalho assistencial. A partir da análise de 91 óbitos e 10.748 casos de profissionais diagnosticados com Covid-19, o estudo revelou que foram perdidos quase 500 Daly no país devido à infecção entre profissionais de enfermagem, sendo a morte prematura a principal razão apontada, "impactando consideravelmente a linha de frente do combate à pandemia", segundo o artigo.
A análise foi feita com dados disponibilizados pelo Observatório da Enfermagem, administrado pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), e por outros órgãos, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e o Institute for Health Metrics and Evaluation, de Seattle (EUA). Os dados se referem a um período de menos de três meses, entre 20 de março e 5 de maio de 2020.
De acordo com os autores, os resultados irão viabilizar a tomada de decisões embasadas acerca de políticas públicas de saúde, e outras ações voltadas para a mitigação dos riscos e consequências da Covid-19 para os profissionais de enfermagem no Brasil. “A pesquisa traz informações primárias, que servirão para o desenvolvimento de outros estudos – como, por exemplo, a avaliação de medicamentos na capacidade de reduzir o Daly”, ressalta Lyra. A intenção, segundo o pesquisador, é rever os dados em dois ou três meses, replicando a metodologia, para fazer uma análise de tendência e, assim, avaliar a progressão da doença.
O professor fará uma live hoje, às 19h, para comentar os resultados apresentados e falar sobre estudos de cargas de doenças (global burden of disease). A transmissão será feita pela página do Laets no Facebook.