Professor da UNIRIO realiza pesquisa em parceria com universidade da Colômbia
O que motiva o turismo em favelas? Quem são os beneficiários com esse turismo? Essas indagações fazem parte do projeto de pesquisa que o professor do curso de Turismo da UNIRIO Luiz Alexandre Mees está desenvolvendo em parceria com mais dois professores da Instituición Universitaria Colegio Mayor de Antioquia (Medellín, Colômbia): professora Ledyz López Zapata e professor Johan Sebastián Gómez.
A pesquisa teve início em março deste ano e tem como principal objetivo analisar as possibilidades e a efetiva contribuição do turismo como ferramenta de desenvolvimento local nos assentamentos informais das Comunas 1 e 13 de Medellín e no Complexo do Alemão no Rio de Janeiro. O foco maior é nas infraestruturas urbanas que acabaram servindo como atrativos turísticos para visitantes como os metrocables (teleféricos) construídos como meio transporte de massa na Comuna 1 e no Complexo do Alemão, e a escalera electrica (escada rolante) construída como estrutura de mobilidade urbana na Comuna 13. Saiba mais sobre esse projeto nesta entrevista realizada pela COMSO com o professor Luiz Mees.
COMSO: Por que encanta tanto aos turistas visitar essas comunidades?
Luiz Mees: São muitas as motivações. Em Medellín, a propagada “transformação da cidade” (de “cidade mais violenta do mundo” em cidade inovadora e modelo urbanístico) e a construção de infraestruturas de mobilidade urbana inovadoras como os metrocables e as escaleras electricas funcionaram como motivadores de visita. No Complexo do Alemão, a partir de entrevistas que fiz pelo meu doutorado com aproximadamente 200 turistas no alto da estação Palmeiras, apareceram três motivações principais de visita: o teleférico (que sugere também um passeio de lazer além da função de “meio de transporte”), a instalação das UPPs (a “pacificação”) e a telenovela “Salve Jorge” exibida pela Rede Globo entre 2012 e 2013, que teve a comunidade como núcleo principal. Aqui no Brasil, a influência das telenovelas (mais que do cinema) e da mídia televisiva em geral é muito grande na visitação turística.
Alguns turistas visitam por curiosidade. Outros por acreditarem ser um passeio “diferente e exótico”, pelo preço baixo de hospedagem ou ainda pelo modismo.
COMSO: Quem são os beneficiários com o turismo na favela? Existe algum projeto de capacitação para os moradores locais?
Luiz Mees: No Rio de Janeiro, o estado, município e algumas entidades privadas contribuíram para a capacitação da própria população moradora das favelas, interessada em iniciativas de turismo.
No Complexo do Alemão, o Sebrae foi o órgão que entrou buscando capacitar os moradores. A questão da capacitação de moradores locais e seus efetivos resultados (ou seja, como essa capacitação é oferecida e quem realmente consegue desenvolver iniciativas de turismo locais) são também questões muito importantes a serem investigadas pelo pesquisador em turismo. Desde o ano passado, tenho uma aluna de Iniciação Científica do curso de Turismo da UNIRIO pesquisando esse tema.
Os beneficiados do “turismo em favela” aqui do Rio de Janeiro, infelizmente, nem sempre são os moradores locais. Percebe-se isso pelo número de debates e trabalhos que aparecem sobre Turismo de Base Comunitária que envolvem o tema. Se olharmos mais localmente, perceberemos também que é sempre uma pequena parte dos moradores da própria comunidade que é beneficiada. No Complexo do Alemão, por exemplo, acho impossível todas as 13 comunidades serem beneficiadas por iniciativas de turismo.
COMSO: Como é a recepção da comunidade? Há interação com os turistas?
Luiz Mees: Em algumas favelas, essa interação é teatralizada. Economicamente interessada. A interação em geral é realizada com atores pré-estabelecidos. Temos também que entender que nem todos os moradores de uma favela são favoráveis ao movimento turístico. Será que gostaríamos de ter um bando de estranhos toda hora passando pela porta da nossa casa? Ou ver que o local onde você tem sua luta cotidiana foi ocupado por pessoas com condições financeiras muito maiores que a sua e que você acaba precisando se submeter a essa população? Ou que os poucos benefícios que o governo/estado fornece são utilizados por estrangeiros mais que pelos moradores?
São pouquíssimas as iniciativas de visitação turística em favelas cariocas que têm um cunho realmente educativo, pedagógico, ou que busquem um real conhecimento do local. Mesmo porque, o turismo tem um caráter fortemente capitalista.
COMSO: Quais as semelhanças entre a Comunidade do Alemão e as Comunas de Medellín, além dos Metrocables?
Luiz Mees: Existem algumas semelhanças em termos do movimento e dinâmicas do Turismo nas duas localidades. Da última vez em que estive pesquisando em Medellín, me surpreendi quando acompanhei um grupo de norte-americanos – que entraram numa casa local e subiram para a laje para fotografar e ouvir o que a moradora tinha para falar sobre “o que é ser moradora de uma Comuna pobre”. Sempre em troca de dinheiro. Esta é uma prática que acontece muito em favelas cariocas e que estava presente no planejamento de alguns roteiros do Alemão. Mas acredito que além dos metrocables, as diferenças são maiores que as semelhanças.
O turismo se apropriou dessa infraestrutura pelo fato dela oferecer também um “passeio agradável”. É isso que vamos pesquisar também. Turisticamente, no início, o teleférico bateu a visitação do próprio Pão de Açúcar. Mas os conflitos armados voltaram com força em 2014 no Complexo. E isso afetou drasticamente as iniciativas turísticas por lá. Eu vi lugares fechando, iniciativas minguando ou acabando, pessoas – que haviam acreditado no turismo – desoladas e sem esperança de qualquer mudança de vida. Foi - e ainda é - muito triste.
(Entrevista - Jornalista responsável: Liliana Glanzmann Vallejo/Jornalista Comso)