“Quem cuida da mente cuida da vida”, ressalta psicóloga do HUGG
Janeiro é marcado por uma simbologia que se renova anualmente. Reflexões a respeito do ano passado e promessas e desejos de mudanças para o momento vindouro são frequentes para a maioria das pessoas. O mês funciona como uma espécie de folha em branco, onde se podem reescrever os rumos aos quais a vida nos leva, fazendo com que nos tornemos autores de nossas caminhadas. Por isso, desde 2014, o primeiro mês do ano é utilizado para a campanha “Janeiro Branco”, de conscientização a respeito da saúde mental.
"Infelizmente as questões relacionadas à saúde mental continuam sendo um tabu. As pessoas têm dificuldade de entender a necessidade deste tipo de cuidado e como afeta o todo. Não existe compartimentalização da saúde, ela é integral: é importante estar bem física, mental e espiritualmente. Quem cuida da mente cuida da vida, e isso tem de ser lembrado, afinal tudo começa na mente. O fato de não estarmos bem emocionalmente afeta nosso cotidiano e nossa capacidade de tomar decisões. Por isso a importância de desmistificar esse tema", informou Priscila Cassemiro Galvão, psicóloga do Hospital Universitário Gaffrée e Guinle (HUGG), da UNIRIO.
Esses estigmas ainda se tornam responsáveis, de acordo com a especialista, por um efeito complicador: a interrupção ou mesmo a não procura de ajuda.
"Parte dos pacientes chegam em um estado mais grave, às vezes até levadas contra a vontade por terceiros, por terem adiado os possíveis tratamentos, com medo de serem taxadas de malucas, evitando assim o reconhecimento da necessidade desse tipo de cuidado", continuou Priscila.
Adicionalmente, a reclusão forçada por causa do devido distanciamento social destacou, em maior grau, a urgência do assunto:
"Muitas pessoas tinham dificuldades emocionais antes da pandemia, mas não davam o devido valor ou não conseguiam enxergar esse problema. Quando veio o confinamento, bastante coisa mudou, afinal a possibilidade de praticar atividades diversas que mascaravam essas questões ficou mais rara. A partir de então, os conflitos começam a aparecer, tanto internos quanto intrafamiliares. Além dessa demanda reprimida, outros transtornos foram causados pela pandemia em si, como: dificuldades de adaptação ao novo momento, medo da morte, ansiedade pelo isolamento. Algumas pessoas que tinham um contexto de vida definido foram forçadas a mudanças radicais. E a facilidade de adaptação está diretamente ligada a nossa saúde, ou seja, caso exista um transtorno mental, de qualquer ordem, não tratado, aumentam as dificuldades de se adaptar e, consequentemente, o sofrimento. Outros fatores criados a partir do confinamento propiciam mais o adoecimento, como por exemplo o aumento do número de casos de violência doméstica, em que a vítima tem de viver em contato com seu agressor", acrescentou a psicóloga.
A especialista ainda salientou a particularidade que profissionais da saúde passam no meio da pandemia:
"Esses profissionais viram suas cargas horárias e de trabalho serem aumentadas radicalmente e muitas vezes com o agravante de não poderem dividir essas tarefas com outros, pois muitos colegas estão afastados, ou mesmo, perderam suas vidas, em virtude da Covid-19", complementou.
Mas, enfim, como ajudar, mesmo que numa fase inicial, quem está sofrendo com essas mazelas?
"Primeiro precisamos estar disponíveis, passando confiança para aquele que queremos ajudar, especialmente quando percebermos que a pessoa não está muito disposta a procurar auxílio. Devemos buscar alternativas para sinalizar que estamos interessados e presentes, afinal, ninguém consegue se abrir com quem não confia. É o primeiro passo, aparentemente simples, mas fundamental", explicou Priscila.
Ou seja, falar sobre o tema, ainda que pareça espinhoso, já auxilia bastante no processo:
"Temos de entender que falar sobre saúde mental e nossos problemas é a solução e não o contrário. Por exemplo, se estamos em dúvida se alguém tem ideação suicida, é importante que perguntemos sobre, num contexto adequado, numa conversa acolhedora e num momento em que a pessoa esteja disposta a se abrir. Abordar isso diretamente e de forma correta não aumenta a chance de essa pessoa se suicidar, pelo contrário. Na verdade, a maioria desses atos desesperados ocorre porque quem está sofrendo acredita estar 'invisível'", adicionou Cassemiro.
A psicóloga, porém, ressalta que nem todo problema é automaticamente depressão. Devemos conseguir separar o que é sentimento do que é transtorno:
"A tristeza faz parte da nossa vida, apesar de vivermos numa sociedade que prega o prazer e a satisfação desmedida, o tempo todo. Só que isso não é real. A tristeza, a raiva e a frustração fazem parte da vida. São emoções que precisam ser validadas, entendidas e faladas. Fazem parte, desde que tenham uma duração e um motivo. Já a depressão é um transtorno que precisa de diagnóstico, com critérios específicos, com uma certa duração. Não existe autodiagnóstico. Podemos ter suspeitas. Se percebemos uma 'tristeza' prolongada, dificuldades, ou falta de vontade, na realização de atividades diárias da vida, até mesmo na higiene pessoal, ou se existem pensamentos de se machucar, necessitamos ligar um sinal amarelo. Entretanto, a avaliação final tem de vir de um profissional, seja psiquiatra ou psicólogo, pois é o especialista que estuda o tema e poderá avaliar, orientar e, quando for o caso, indicar algum tratamento efetivo, de acordo com o momento", completou.
Ainda assim, Priscila aponta alguns autocuidados que podemos ter, no cotidiano, para cuidar da nossa saúde mental:
"Temos muitos meios de melhorar nosso bem-estar, a começar pelo nosso comportamento. Existem estudos que mostram que estarmos em contato com a natureza traz benefícios físicos e mentais, pelo simples fato de estarmos em contato com a natureza. Além disso, praticar atividades físicas de que gostamos e estarmos cercados pela nossa rede de proteção, seja de amigos ou de familiares, presencialmente ou não, são fundamentais para nos fortalecermos", finalizou.
(Assessoria de Comunicação do HUGG)