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APLICANDO MATEMÁTICA NA SOLUÇÃO DE UM MISTÉRIO

Autoria - Édira Castello Branco de Andrade Gonçalves Supervisão - Prof. Dr. Marcelo Rainha

Trata-se de uma proposta de atividade envolvendo modelos matemáticos e a lei de resfriamento de um corpo. Assim considerando que a matemática está em todos os lugares, mesmo sendo em alguns, momentos não tão fácil de perceber, mostra-se o modelo de resfriamento do corpo, a partir da investigação forense, para determinar o  tempo de morte. Esta narrativa ocorre com a personagem Agatha Bom Sherlock.  

Introdução  

 Meu nome é Agatha Bond Sherlock, detetive particular que resolve casos com o  uso da matemática. Você pode achar estranho, mas querendo, você vai observar que  a matemática está em todo lugar. 

 Neste momento, na minha frente se encontra um casal desesperado. São irmãos.  A jovem diz que acabaram de matar seu marido. Estamos no interior da Inglaterra. Pergunto: como ocorreu? Ela informa que chegou em casa e o marido estava deitado e  não se moveu quando ela chamou. Sacudiu e nada. Percebeu que ele não respirava.  Entrou em desespero. Havia saído de casa às 12h. Seu marido estava feliz e carinhoso. Foi ao shopping e ao chegar em casa às 19h, o marido estava morto. Sua reação  imediata foi chamar a empresa que seu marido contratou, na semana retrasada, para  cuidar do enterro da família, caso alguém morresse. 

 A jovem, estava bem impactada pois imaginava que seu marido havia recebido  uma informação “divina” e por isto a preocupação para contratar o serviço funerário... 

 Perguntei: onde estava o defunto? Já está no caixão, enterro imediato, como  estabelecido pelo marido no contrato que fez com a empresa. Mencionou o nome da  empresa: “Aqui todos dormem e não morrem Ltda”. 

 Lógico que tem algo errado nesta história, pensei eu. Para tranquilizar a jovem,  comecei uma narrativa.  

 Você conhece Isaac Newton? "Ele é um dos principais físicos, matemáticos,  filósofos e alquimistas da história. Uma das leis que ele estabeleceu é a lei do arrefecimento ou resfriamento. Você me permite aplicar esta lei no corpo do seu marido?  A jovem não compreendeu, mas autorizou. 

Ao chegarmos no local, o caixão estava sendo fechado, paramos a equipe e fui  verificar o corpo. 

 Aqui, caro leitor, cabe uma explicação mais detalhada da Lei do Resfriamento  de Newton. Esta descreve uma situação de equilíbrio térmico entre um corpo e o  ambiente em que ele se encontra.  

“A taxa de variação da temperatura de um corpo (sem fonte interna) é proporcional à  diferença entre sua temperatura e a do meio ambiente”. 

Embora pareça simples, envolve outras variáveis como: a) superfície de contato do  corpo com o meio; b) calor específico, que quanto maior, exigirá mais energia e c) tempo  de contato. Mas como a matemática entra nisto? Observe que tem que ser consideradas estas variáveis e existe um campo da matemática que estuda este universo e chama  Modelagem Matemática.

A Modelagem Matemática é um processo de interação da Matemática com um  problema real, com o objetivo de analisar comportamentos, discutir simulações, apontar  dados, fazer previsões, buscar explicações, tomar decisões, etc... A Lei de Newton  corresponde a um modelo matemático e será descrita a seguir. 

Desenvolvimento  

Uma vez cessadas as funções vitais, o corpo esfria a uma média de 1°C a 1,5°C  por hora. Considerando que a temperatura média de um ser humano é entre 36°C e  37°C, o cadáver atinge a temperatura do ambiente em 24 horas, no máximo (figura 1)

No processo pericial, a temperatura do corpo é medida com termômetro de  líquido em bulbo de vidro (TLBV) para inserção retal na etapa anterior a remoção do  corpo e termômetro com sonda “agulha” para medição da temperatura do cérebro após  a chegada do corpo à sala de necropsia. Outras partes do corpo humano podem ser  utilizadas para fins de investigação forense – e.g., fígado, globo ocular e tímpano,  sempre dependendo do tipo de equipamento disponível para aplicação.

 

                                                            resfriamento corporal

https://images.app.goo.gl/XW99hKpuTapEHbYH9

Figura 1 – Processo gradual de resfriamento de um corpo

Considerando o enunciado da lei, quando um corpo de temperatura T é inserido em um ambiente de temperatura constante Ta, a temperatura T se aproximará de Ta. 


Assim, se a temperatura T for maior que a temperatura Ta, o corpo resfriará, caso contrário, se T for menor que Ta, aquecerá. A temperatura do corpo, considerada uniforme, será uma função do tempo,        T = T(t).

Lembrando que a derivada de uma função representa uma variação, a lei pode ser expressa pela equação diferencial ordinária de primeira ordem:

 onde λ > 0, pois se T > Ta , então dT/dt < 0 e se T < Ta , então dT/dt > 0

Sendo T = Ta , as temperaturas do corpo e ambiente são iguais, assim não haverá variação, sendo uma solução da equação 1. 

Resolvendo a equação 1 pelo agrupamento de variáveis, temos:

Integrando ambos os lados:

 

 

Aplicando a propriedade fundamental dos logaritmos :

Como a temperatura do corpo será sempre maior que a do ambiente, o logaritmando será sempre positivo, e o sinal de módulo é desnecessário.

Sendo C uma constante, a solução geral da equação é dada por:

Vamos voltar ao nosso “defunto”. Vamos analisar o resfriamento deste corpo. No momento da morte, a temperatura do corpo estava no padrão fisiológico 36,5oC. A temperatura ambiente 18oC. Considerando que neste momento são 23h, vamos pensar:

a) Individuo morreu assim que a esposa saiu de casa, assim já se passaram 11 horas do momento da morte

b) Individuo morreu um pouco antes da esposa chegar em casa, assim já se passaram 4 horas do momento da morte

Definindo a provável temperatura do corpo nestes tempos estabelecidos, podemos verificar, a real temperatura do corpo para definir o tempo real pós morte.
O leitor deve estar se perguntando a razão de eu não ter simplesmente medido a temperatura do corpo.


Todos já irão compreender, e, aqueles que estão acompanhando meu raciocínio, já devem ter percebido.

Aplicando o modelo apresentado, temos:

T(0) = 36,5       T(t ∗) = ?

t* – tempo decorrido desde o instante da morte, nos nossos exemplos:

a) 11horas;

b) 4horas.

Como já mencionado, o resfriamento do corpo ocorre a uma média de 1 °C a 1,5 °C por hora. Considerando a temperatura ambiente baixa, vamos utilizar a taxa de resfriamento 1/h, logo T(1) = 35

 

 

mpd corr

Com estes resultados, posso esperar que a temperatura do corpo do “defunto” está entre 25 e °C . Mas eu sei que a temperatura do “defunto” não estará nesta faixa de temperatura, afinal sou muito boa no que faço.


Com todos os presentes acompanhando, segui com a medição da temperatura, e, como desconfiava a temperatura estava 36,5 °C . O “DEFUNTO” NÃO
ESTÁ MORTO.


Já havia enviado uma mensagem pelo meu correio mágico (Tody meu labrador)para o inspetor Hercule Poirot , e ele acaba de chegar. Os funcionários da empresa começam a ficar tensos, dizendo que tinha que seguir o contrato , tinham que fechar o caixão e levar o “defunto”.       

A viúva não está entendendo nada, só chora. E, de repente, o “defunto” começa a tossir e a se levantar. A viúva, aos berros agradece a Deus pelo milagre!!! Mas.... o inspetor dá ordem de prisão ao pessoal da empresa e ao defunto.

Com calma expliquei oque aconteceu para a minha cliente. Seu marido havia forjado a morte para fugir com sua amante. Ingeriu uma substância que reduz
temporariamente as funções fisiológicas, por isso ela acreditou que estava morto. Mas, a matemática resolveu mais este mistério, o que já era esperado, pois afinal, eu sou Agatha Bond Sherlock. 


Conclusão
O modelo apresentado é utilizado na investigação forense, mas, como visto, está sujeita a diversos indicadores, podendo ter falhas. A principal razão da deficiência dos modelos de previsão do resfriamento humano se deve à incerteza na obtenção da taxa de transferência de calor entre o corpo e o meio. Considera-se uma estimativa “razoável” do tempo pós-morte um valor dentro de uma margem de até 2 horas, justificando, porque peritos preferem reportar um intervalo de tempo (e.g., “entre 17h00 e 19h00”), em vez do valor específico (e.g., “as 18h00”) obtido a partir de algum dos modelos disponíveis.

Referências
Isaac Newton: história, teorias e curiosidades - Brasil Escola. (n.d.). Retrieved November 7, 2023, from https://brasilescola.uol.com.br/fisica/um-fisico-chamado-isaac-newton.htm
Marco A Simões. (n.d.). http://masimoes.pro.br/fisica_aplic/resfr.html.
Marinho, G. S., & de Farias, R. F. (2023). Considerações teórico-experimentais sobre o resfriamento pós morte. Revista Brasileira de Criminalística, 12(1), 47–53. https://doi.org/10.15260/rbc.v12i1.495
Muniz, W., Rodrigues, D., Fürkotter, M., Davoli, M., & Lopes, M. (2019). Lei do resfriamento de Newton: modelagem matemática e ensino-aprendizagem.
http://www.sbemparana.com.br/eventos/index.php/EPREM/XV_EPREM/schedConf/presentations
Rodney Carlos Bassanezi, & Wilson Castro Ferreira Jr. (1988). Resfriamento de um corpo - difusão de calor. In Harbra Ltda (Ed.), Equações diferenciais com aplicações (Vol. 1, pp.43–45).